quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Aurora-sangue-e-brasa

O dia é o dragão de Jorge.
Cenário de sangue e brasa
É o anoitecer.
O dragão exausto da luta
desmaia, talvez só
adormeça.
A trégua é negra
como o luto.
Jorge enganado
se pensa vencedor:
um par de olhos
estrelados,
por apenas horas,
a íris se faz rubra
refletindo
a nova peleja:
o dragão desperta
aurora-sangue-e-brasa.

Médios atos

Em meio à tragédia
Da queda de uma louça
Se mobilizam os presentes
E se livram dos cacos
Quase que com a urgência
Do assassino que oculta o cadáver.
O imediato dilata pupilas:
Se desapercebe o sangue que respinga nas paredes,
Os pedaços de louça que se calam se camuflam
E passam a morar para sempre debaixo dos móveis.
Nos desencontros da vida
Se há pressa para algo findar
Mais das vísceras dele
Se esquece aos arredores de si.

Vespertinas ou demonicidades

Não que me desagrade
o inferno externo:
Cada qual com sua demonicidade
Caminhando ou nos dirigíveis
Trafegam pelo inferno público.
Posso até dizer que gosto
da presença desses diabos
os vertebrados, os pobres, os ricos.
E não me chateio com
os sons cruéis que emitem
nem com os sons que fazem emitir.
Não me importo com toda a fumaça
das máquinas, dos cigarros alheios.
Olhando para o céu vermelho
banhado de sangue do dia que
morre pela espada de Jorge,
me retiro do inferno exterior
para o reservado não menos infernal,
vou fumar meu cigarro,
a cada trago, mais sangue no céu
mais sangue no inferno público,
mas aqui no meu inferno particular
vou estender a mão para fora da janela
comprimir a brasa contra a parede da fachada
e observar as faíscas que se libertam do cigarro
e voam pela janela para morrer como o dia
agora um cadáver já coberto
por um plástico preto como a noite.